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Cenários e Personagens

Fecho os olhos e vinco mentalmente os dedos na cadeira à minha frente.
Sim, vou viajar anos atrás e agarrar-te naquele momento.

Naquele momento em que tropeçei, insensata, presa em rotinas e quase um beijo te roubei. Sim, aquele momento em que seria infiel e fria, intensa e apaixonada, surpreendida por um arrebatamento que não era calculado. Não fingir, não me aperceber a tempo, não virar a cara uns estrategicamente graus ao lado do ângulo que pelos vistos era o certo. Não fingir que não se passa nada. Deixar ir, esquecer a moral, o bem e o mal e talvez seria assim que, eu a roubar-te e não roubada, serias atingido por algo que me atingiria.


Naquele momento em que voltei a escrever uma mensagem. Perceber que talvez não. Desligar o telemóvel. Ser pragmática, olhar-te, sorrir face ao teu canto e encostar-me, como quem não quer coisa, a ti. Usar todas as armas femininas que nunca aprendi, pois sempre as soube, feitiços que vêm do berço e que sempre achei adormecidas. Brincar e trocar palavras de duplo sentido. Flertar. Manobrar-te e entrar num passo de dança fingindo que não sei. O céu com estrelas, o mundo haveria de ver.


Naquele momento em que desvalorizei os livros que falavas, as acções que tomavas e as actividades que fazias. Pois não as via como manobras de sedução, ou de honrarias de macho para a fêmea à sua frente. Vou assumir que sim. Que estava a ser seduzida, manobrada, conduzida. Vou ser fútil, mostrar deslumbramento face às tuas acções. Pestanejar, arrulhar, estar presente, Mostrar-me doce e dócil. Sentir-me atraente e vangloriada. Mostrar-me disponivel. Não argumentar, não debitar razões, não ser compincha nem companheira de sonhos ou gostos.


Naquele momento em que estava dilacerada. Usar a dor, o desprezo, a luta, a ameaça. Usar o charme, usar a luxúria, a arrogância, o sexo e o desespero. Usar todas as armas de que se dispõe quando não se tem chão, nem teto , nem sequer paredes. Perder-me em depravação sem pudor ou vergonha. Esquecer o certo e o errado. Usar o tacto, o sabor, o contato, a crueldade dos sentimentos espezinhados.

Em todos esses momentos e nos outros, ser outra, a outra, personagem perdida e delapidada, sem mente, sem coração, só corpo e impulso, pulsão e espontaneidade. Saber, sentir que sim, assim conseguiria ganhar-te. Ter-te.

"Mas, o amor não é ter."

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Do que vale a pena (só sei falar sobre amor)

As pessoas não fazem ideia, não sonham, não pressentem.... Mas em termos emocionais sempre tive uma sorte avassaladora. Sim independentemente, de tudo, a sorte, o timing é fundamental e crucial. Nós apenas jogamos com as cartas que a vida nos dá. E eu tenho/tive uma sorte avassaladora. Porque amei demais, sofri demais, porque mesmo quando perdi, ganhei muito. Porque tive hipóteses, porque tive esperanças, porque me expus, porque nunca, mas nunca me acobardei. Porque tive medo, muito medo. Porque tive coragem. Porque foi sempre vulnerável e sincera. Porque sei a diferença entre perder a dignidade e perder o orgulho. Caramba não sei mesmo explicar como certas experiências são tão enriquecedoras. Quem toca o céu nunca volta ao seu ponto original. E caramba em termos estatísticos ainda tenho mais de metade de uma vida para viver.