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Humanidade.

 Ela  deu dois passos atrás sustendo a respiração,  os cafés saltando das chávenas. Quase que gritou o nome do marido, estridente, arrastando no tempo, como faz, sempre, sempre, que lhe quer contar algo que acha importante. Mas segurou-se. Arregalou os olhos, apertou os lábios, num meio tempo entre a indignação, a inveja, a estupefacção. Na memória presente as mãos dele enrolados no cabelo dela, os corpos demasiado próximos, as bocas presas. 

Engoliu em seco, ficou hesitante entre ir-se embora, e tentar traduzir os murmúrios rápidos prolongados por silêncios densos. Ouve tempo, desperdício, agora, esqueci, palavras soltas que a fazem corar de curiosidade, beatice e prazer, eu bem sabia, não sabendo nem um pouco. Fica estonteada pela novidade, pelo clima de mistério, pela excitação de notícia fresca, de segredo e de algo que só ela sabe.  

Não se segura e corre pelas escadas. Vê o marido, na mesa de pedra do pátio, cerveja na mão, cigarro meio fumado nos dedos, olhos semicerrados no horizonte, e mal abre a boca para falar, ele atira-lhe um "Deixa." ríspido, familiar e antigo.  

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As pessoas não fazem ideia, não sonham, não pressentem.... Mas em termos emocionais sempre tive uma sorte avassaladora. Sim independentemente, de tudo, a sorte, o timing é fundamental e crucial. Nós apenas jogamos com as cartas que a vida nos dá. E eu tenho/tive uma sorte avassaladora. Porque amei demais, sofri demais, porque mesmo quando perdi, ganhei muito. Porque tive hipóteses, porque tive esperanças, porque me expus, porque nunca, mas nunca me acobardei. Porque tive medo, muito medo. Porque tive coragem. Porque foi sempre vulnerável e sincera. Porque sei a diferença entre perder a dignidade e perder o orgulho. Caramba não sei mesmo explicar como certas experiências são tão enriquecedoras. Quem toca o céu nunca volta ao seu ponto original. E caramba em termos estatísticos ainda tenho mais de metade de uma vida para viver.